O Globo, October 22, 2018

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Acaba, 2018? Elvis Costello minimiza tensão atual: 'Em 1963, diziam que mundo ia acabar'

Ao G1, cantor inglês fala de Brexit, Trump, Paul McCartney, 'She', 13 anos longe do Brasil e álbum novo: 'Espero que faça produtores de shows se lembrarem de que estou na ativa'.

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Braulio Lorentz

Nada mais parece tirar Elvis Costello do sério. Antes conhecido por ir do modo mais pacato ao mais insano em segundos, agora ele parece falar sobre qualquer tema como se estivesse narrando uma compra de pão na padaria.

Tanto faz, o pragmatismo domina. O assunto pode ser uma cirurgia recente para retirada de um tumor, uma zoada de Paul McCartney, o fato de para alguns ele ser "o cara que canta 'She', daquele filme lá", Brexit ou 13 anos sem tocar no Brasil...

Durante 20 minutos de papo por telefone com o G1, o cantor londrino de 64 anos só deixa seu jeitão blasé de lado ao falar do seu recém-lançado disco "Look Now".

Quando o assunto foge do "uptown pop" de seu 25º álbum de estúdio, ele pega na mão da lógica e vai, mas com alguma ternura.

Costello fala da amizade com o argentino Sebastian Krys, ouvido com Sandy & Junior e astros do pop latino antes de produzir seu disco, e prefere não revelar quais artistas ouve: "Escuto coisas que você ficaria até surpreso por eu saber que existem".

G1 - Como é trabalhar com o Sebastian Krys e como o conheceu?

Elvis Costello - Eu conheço Sebastian há 10 anos. Nos conhecemos em Miami e nos tornamos amigos. Tivemos oportunidade de trabalhar juntos antes algumas vezes... Gravei com uma banda produzida por ele em Los Angeles.

É muito complexo o trabalho de produção e Sebastian é o cara que nos faz ter certeza de que só gravamos aquilo que realmente queríamos ouvir. [risos] Quando eu estou na frente do microfone, quero me concentrar. Ele é um cara muito dedicado, tem ótimo senso de humor e entende o que é estar em uma banda.

Quando estamos juntos tocando, passamos juntos por coisas que acontecem na vida de todo mundo. A gente cresce, eu espero que cresça, seus filhos ficam velhos, seus amigos ficam velhos e você perde alguns deles...

G1 - Eu assisti ao seu show em Belo Horizonte, na sua segunda vinda ao Brasil. O que você lembra daquela noite e da vinda anterior?

Elvis Costello - Eu estive aí com uma big band, no Free Jazz Festival [em 1997]. Minha primeira experiência de show no Brasil não foi como sendo a atração principal do meu show, mas como só mais um convidado de uma banda. É claro que eu acabei tocando músicas pouco comuns... Foi uma experiência incrível visitar o Brasil pela primeira vez. É um lugar sobre o qual você fantasia muito vendo fotografias, filmes e ouvindo músicas. Daí tive a chance de ver tudo por mim mesmo.

Quando voltei com o Imposters, lembro que tocamos no mesmo festival, mas tinha trocado o nome [ Tim Festival, em 2005]. Foram shows bem intensos. É claro que a gente estava tentando juntar no show tudo o que a gente já tinha gravado, porque não sabíamos se teríamos outra oportunidade de tocar no Brasil. Não sabíamos quais músicas os brasileiros conheciam também. Tentamos escolher quais conseguiam representar o nosso som.

"Eu sei que 'She' é conhecida em muitos lugares do mundo, mas é tão diferente do meu repertório, por ser uma balada romântica mais direta. Eu já tive experiências em que o público ficou meio chocado quando eu comecei a tocar 'I want you'. Porque é bem diferente do que esperam".

G1 - Por que nunca voltou?

Elvis Costello - Eu gostaria de voltar. Mas não temos planos para agora. Com certa frequência, temos conversas. O problema, você sabe, é que ao falar de América do Sul você está falando de vários países. Você tenta fechar com mais de um país, mas há diferença na confiança de que dará público. Por isso, a maior chance de tocar é mesmo em festivais. É complicado fazer só um show.

"Espero que esse novo disco faça as pessoas e os produtores de show [no Brasil] se lembrarem de que estou na ativa e fazendo música até hoje. E ela é tão boa quanto aquelas outras que a gente fazia... Adoraria tocar músicas deste disco, mas também fazer um 'best of' com músicas de 40 anos atrás".

G1 - Já me disseram que eu me pareço com você. Como é saber que tem gente no Brasil que olha um homem branco de óculos de aro grosso e fala 'Elvis Costello'?

Elvis Costello - É estranho, porque quando eu comecei falavam que eu usava "óculos do Buddy Holly". Sempre vai acontecer isso, alguém comparando alguém com alguém famoso... Mas não sei se todo garoto no mundo que seja... hipster... necessariamente pense no meu nome quando compra esse tipo de óculos, mas alguns sim.

G1 - Eu meio que fiz isso.

Elvis Costello - [Risos] Que bom.

G1 - Para a maioria dos brasileiros, você é 'o cantor de 'She', daquele filme com a Julia Roberts'... Para outros, é o um cara importante do rock. Como é ter esses dois tipos diferentes de público?

Elvis Costello - Bem... (longa pausa) Ter uma música como essa ('She', versão do sucesso do francês Charles Aznavour) que tem tanto sucesso, que foi trilha de um filme exibido em todo mundo... É possível que eu não estivesse falando com você se não fosse um filme de tanto sucesso como "Um lugar chamado Notting Hill".

Filmes conseguem ir a lugares onde eu não conseguiria ir. Não controlo isso... Tem gente que só conhece uma música minha. Sorte minha que conhecem pelo menos uma! Pelo menos sabem meu nome. Para mim, o outro lado do mundo é um mistério. Eu tenho, como dizem, um cartão de visita. Ele permite que as pessoas possam ir atrás de outras músicas. E quando eu faço shows tento fazer isso, incorporar todos os tipos de música que eu faço.

Eu tenho muitas possibilidades: piano, orquestra, banda, cantar olhando nos olhos do público... Eu sempre aprendo algo fazendo tipos diferentes de música. A vida vai passando e vou aprendendo...

G1 - Paul McCartney disse recentemente que usou Auto-Tune em uma música, mas não a lançou. Uma das razões é que ele disse que você iria falar 'Poxa, que m... é essa, Paul'. Você diria isso mesmo?

Elvis Costello - [Risos] Eu acho que ele falou isso porque houve vezes em que estivemos juntos no estúdio gravando e daí ele tinha uma ideia sobre uma parte da música e eu tinha uma ideia totalmente diferente... Ele deve ter se lembrado de casos assim e fez essa brincadeira. Mas eu entendi o que ele quis dizer.

Às vezes, quando você tenta fazer algo que é inesperado, é normal pensar no que um ou outro amigo vai dizer. Então, fico lisonjeado que tenha pensado em mim. É engraçado, porque eu nunca diria o que ele deve ou não fazer. É um prazer tê-lo conhecido. Eu nunca imaginei que quando era fã dos Beatles teria chance de escrever músicas com ele.

G1 - Você disse que não gostaria que esse disco fosse anunciado com as frases: 'Lembra desse cara? Bem, ele fez um disco que vai te fazer lembrar que você gostava dele'. Então, qual seria a melhor forma de definir o disco?

Elvis Costello - Não sei, não é o meu trabalho pensar neste tipo de coisa. [Risos] Mas posso dizer que é um disco de uptown pop realmente bom, lindamente tocado e gravado. Estou muito agradecido por ter feito parte dele. Ouvir minha voz nestas músicas me fez bem.

G1 - Como ter sido diagnosticado com câncer te afetou na hora de escrever e gravar o disco?

Elvis Costello - Não afetou em nada as composições, porque já tinha escrito tudo. Mas preciso esclarecer uma coisa: as pessoas exageraram ao falar disso. E não quero que fiquem preocupados. Os médicos identificaram algo [um pequeno e agressivo tumor sobre o qual ele não dá detalhes] que precisava ser removido, antes que eu ficasse realmente doente. Eu não fiquei mal.

"Estava prestes a acabar a gravação da parte instrumental e faltava gravar os vocais quando descobri que faria essa cirurgia. Então, claro, me afetou um pouco na hora de cantar. Fiquei apreensivo e preocupado. Mas me recuperei, fiz um show de uma hora em Chicago e teria ficado ainda mais tempo no palco, mas era um festival..."

A imprensa exagerou um pouco, não sei por que falaram isso, mas ficou parecendo que eu tinha uma doença grave. Mas era mais cansaço da cirurgia, por isso cancelei shows. Vou sair em turnê a partir de novembro e acho que o que aconteceu ficou no passado agora. Sou sortudo. Mas obrigado por perguntar...

G1 - Sendo um bom observador, como você analisa os tempos que estamos vivendo, com notícias como o Brexit e o governo Trump?

Elvis Costello - Talvez essa seja uma das vantagens de ter a idade que tenho. Minhas primeiras memórias são de 1963... Todos diziam que o mundo ia acabar amanhã. Eu tinha oito anos, lembro que o presidente Kennedy foi assassinado e daí veio Richard Nixon, o Vietnã... Você via aquelas imagens da guerra toda noite, crianças sendo queimadas com napalm.

Se você presta atenção no que está acontecendo no mundo quando é jovem ou criança, você pensa que está vivendo o pior momento da história. Pergunte aos meus pais o que eles pensavam sobre o que eu estava sentindo sobre o mundo. Eles cresceram durante a crise de 1929, viveram com a segunda guerra mundial...

Mas também com o outro lado, com o que é corajoso, nobre, certo... E agora ainda temos esse monte de aparelhos para escrever um monte de coisas que não são verdades. Não acredito no que os outros falam. Especialmente, nos políticos. São mentirosos e não confio em nenhum deles. Gostaria que o mundo tivesse mais pessoas que eu admirasse.

"Por que eu iria me preocupar com os problemas do mundo? Minha preocupação não mudaria nada. Temos que acreditar uns nos outros. Às vezes, o mais importante não é o que acontece entre você e o mundo, mas o que acontece entre duas pessoas. E duas pessoas são mais fortes do que uma".

G1 - E o que você vem escutando de música neste ano?

Elvis Costello - Eu lembro de um monte de discos que eu ouvi, mas eu não gostaria de fazer uma grande lista para você agora... Eu acabaria esquecendo algo. Eu prefiro não ficar falando pros outros o que venho ouvindo. É que muda muito também.

Às vezes, ouço música lançada há muito tempo. Mas outras vezes eu escuto coisas que você ficaria até surpreso por eu saber que existem, sabe? Eu tento ser bem mente aberta, gosto de ser surpreendido. Não sou sentimental... Gosto dos discos que eu gosto, sabe?

G1 Ouviu: Look Now, de Elvis Costello

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O Globo, October 22, 2018


Braulio Lorentz interviews Elvis Costello following the release of Look Now.

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Elvis Costello posa em Nova York, em setembro de 2018, durante o lançamento do disco 'Look Now'
Photo credit: Matt Licari/Invision/AP

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Elvis Costello posa em Nova York, em setembro de 2018, durante o lançamento do disco 'Look Now'
Photo credit: Matt Licari/Invision/AP

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Elvis Costello posa em Nova York, em setembro de 2018, durante o lançamento do disco 'Look Now'
Photo credit: Matt Licari/Invision/AP




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